O Brasil foi um dos países que não assinaram hoje o comunicado final da Cimeira para a Paz na Ucrânia, documento que pede o envolvimento de todas as partes nas negociações de paz e “reafirma a integridade territorial” ucraniana. Pelo sim e pelo não, Angola (ou seja o MPLA) mantém-se em cima do muro. Não esteve presente (questões de agenda, diz o general João Lourenço) e, é claro, não assinou o comunicado.
Por Orlando Castro (*)
Segundo a agência noticiosa espanhola Efe, entre os países presentes que não assinaram o comunicado estão os Estados-membros do BRICS, um bloco de países composto por Brasil, Índia e África do Sul, bem como pelas ausentes China e Rússia.
Também não subscreveram o documento Arménia, Barém, Indonésia, Líbia, Arábia Saudita, Tailândia, Emirados Árabes Unidos e México.
O documento, que pede que “todas as partes” do conflito estejam envolvidas para se alcançar a paz, foi subscrito por 84 países, incluindo os da União Europeia, Estados Unidos da América, Japão, Argentina, Somália e Quénia.
O texto, citado pela agência France-Presse (AFP), reafirma “os princípios da soberania, da independência e da integridade territorial de todos os Estados, incluindo a Ucrânia”.
Na sexta-feira, o Presidente russo, Vladimir Putin, prometeu ordenar imediatamente um cessar-fogo na Ucrânia e iniciar negociações se Kiev aceitasse a rendição incondicional, ou seja – segundo Moscovo – começasse a retirar as tropas das quatro regiões anexadas por Moscovo em 2022 e renunciasse aos planos de adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO).
As reivindicações constituem uma exigência de facto para a rendição da Ucrânia, cujo objectivo é manter a sua integridade territorial e soberania, mediante a saída de todas as tropas russas do seu território, além de Kiev pretender aderir à aliança militar. As condições colocadas por Moscovo foram rejeitadas de imediato pela Ucrânia, pelos Estados Unidos e pela NATO.
De facto, a agenda do general João Lourenço está repleta para os próximos 10 anos, pelo menos. No passado dia 23 de Abril o embaixador russo em Angola, Vladimir Tararov, reconheceu a dificuldades (de agenda) para João Lourenço deslocar-se à Rússia, a convite de Vladimir Putin, em Maio do próximo ano, mas lá arranjou uma vaga…
Segundo Vladimir Tararov, o general João Lourenço aceitou o convite de Vladimir Putin para participar, em Moscovo, a 9 de Maio de 2025, nas “comemorações da vitória sobre o fascismo”, na II Guerra Mundial. Se Volodymyr Zelensky tivesse metido uma cunha ao “querido líder” russo…
“Isso tem grande importância para nós, porque convidamos os nossos amigos mais próximos para que possam partilhar connosco a alegria da vitória contra o fascismo, isso tem grande importância para todo o mundo, porque desta vitória saiu a descolonização, a libertação nacional de vários países, não só da África, mas também da Ásia, e temos muitas coisas para discutir e compartilhar entre nós”, referiu o embaixador russo.
Cometendo o gravíssimo erro de não se aconselhar com o “campeão da paz” de África, Volodymyr Zelensky afirmou durante a sua recente visita a Bruxelas, que Vladimir Putin iria tentar “estragar” a Conferência para a Paz.
O presidente ucraniano afirmou que os países que evitam participar na cimeira para a paz, na Suíça, estão “satisfeitos” com a guerra na Ucrânia. Com afirmações deste tipo, Zelensky está a irritar o general João Lourenço. E quando o dono de Angola se chateia, fica mesmo… chateado!
“Só há dois cenários: a paz verdadeira ou um novo prolongamento da guerra”, disse o líder ucraniano, que acredita que a cimeira na Suíça poderá servir para “obrigar a Rússia a fazer a paz”.
“É absolutamente, absolutamente possível. Tudo depende da determinação dos líderes mundiais e da escolha real de cada Estado: se quer estabelecer uma paz verdadeira ou se está satisfeito com a situação actual, ou seja, se está satisfeito com a guerra”, considerou Zelensky.
Entre os participantes na cimeira estiveram os inimigos de Vladimir Putin (e semi-inimigos de João Lourenço) como a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, o chanceler alemão, Olaf Scholz, o presidente francês, Emmanuel Macron e o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau.
No dia em que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, foi a Lisboa para assinar um novo acordo bilateral de segurança e cooperação, Portugal confirmou – e cumpriu – a sua presença na Cimeira, garantindo o seu empenho em ajudar a Ucrânia, não apenas militarmente, mas também nos encontros diplomáticos das próximas semanas.
“Se querem a paz, vamos reunir-nos na cimeira da paz. É bom que preparemos esta plataforma com outros parceiros, porque a guerra está connosco (…) Nós somos as vítimas, somos atacados e mortos”, declarou Volodymyr Zelensky. Mas “se querem guerra, vão participar na reunião que a Rússia quer organizar”, insistiu o presidente ucraniano, apelando à comunidade internacional para que a evite.
O Kremlin reagiu, afirmando que era “absurdo” e “inútil” realizar uma cimeira de paz na Ucrânia sem a participação da Rússia.
“Do nosso ponto de vista, esta conferência é absolutamente inútil para encontrar uma solução para o conflito na Ucrânia”, declarou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, numa entrevista à estação pública russa RT. “É de facto absurdo reunir e discutir seriamente estas questões sem a participação do nosso país”, sublinhou.
Voltemos a Angola para perguntar: em quantos tabuleiros joga o MPLA? O ministro das Relações Exteriores, Téte António, recebeu no dia 26 de Janeiro o embaixador russo, Vladimir Tararov, com quem avaliou o estado das relações bilaterais e a exploração de novas oportunidades de cooperação entre os dois países.
Pelo sim e pelo não, o MPLA (governo) mantém o suposto ou fictício divórcio com Moscovo em… “stand by”. Por alguma razão o general é, é, é o “campeão da paz”.
Angola (o MPLA, mais exactamente) e a Rússia têm relações privilegiadas desde 8 de Outubro de 1976, data em que foi assinado, em Moscovo, na altura capital da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), o Tratado de Amizade e Cooperação.
A 16 de Novembro de 2004, os dois países rubricaram, em Luanda, um acordo para o relançamento da cooperação nos domínios económico e técnico-científico e, no dia seguinte, criaram a comissão intergovernamental de cooperação económica, técnico-científica e comercial.
Actualmente, de acordo com o Ministério das Relações Exteriores, a cooperação entre os dois países é mais significativa nos sectores da energia, geologia e minas, ensino superior, formação de quadros, defesa e segurança, telecomunicações e tecnologias de informação, pescas, transportes, finanças e banca.
Em 2019, a Rússia garantia que queria reforçar a cooperação com Angola, então baseada sobretudo no sector diamantífero, nos domínios do turismo, extracção de recursos minerais, indústria, formação de quadros e agricultura.
Sobrará ainda alguma coisa para os velhos camaradas do MPLA explorarem?
Na altura, segundo o embaixador Vladimir Tararov, que anunciava a visita a Angola de uma delegação de 18 empresários russos, a cooperação bilateral iria “ajudar a erguer a economia e a indústria”. Disso não tenhamos dúvidas. Eles vão entrar com o “know how” (saber) e nós com as riquezas. Depois? Bem. Depois nós ficamos com o “know how” e eles com as riquezas. Simples. Simples para quem não tem, como acontece com os dirigentes do MPLA, o cérebro nos intestinos.
“O Presidente João Lourenço disse que isso seria muito útil para as nossas relações bilaterais, temos que virar a cooperação para o domínio económico, e o que é mais importante, o agro-industrial”, frisou Vladimir Tararov.
Segundo o diplomata russo, no encontro com João Lourenço (o general Presidente formado e formatado na Rússia) foram também abordadas questões saídas do fórum económico na cimeira de Sochi, tendo igualmente agradecido em nome do seu governo a participação do Presidente angolano naquele evento.
O embaixador russo em Angola frisou que a cooperação iria ser desenvolvida nos domínios turístico, humanitário, formação de quadros, extracção de diamantes, desenvolvimento industrial e cultura.
No dia 28 de Abril de 2022, Vladimir Putin falou ao telefone com o seu camarada João Lourenço, por iniciativa do Presidente do MPLA. Bons e velhos amigos serviam (na altura) exactamente para isso. Na altura admitia-se a possibilidade de o MPLA usar em Angola a estratégia russa na Ucrânia, alegando que era a única maneira de se defender era “desnazificar” a UNITA… No entanto, Putin falhou. João Lourenço virou-se (isto é como quem diz) para Joe Biden.
Segundo a agência russa RIA Novosti, a pedido de João Lourenço, o Presidente Putin informou, na altura, “sobre as causas e objectivos da operação militar especial para proteger o Donbass e também fez avaliações fundamentais da situação das negociações com representantes ucranianos”.
A “satisfação com o nível de relações amistosas” entre Angola e Rússia “foi expressa por ambos os lados”, indicou a agência russa. “Por ambos os lados”, recorde-se.
“Os compromissos com o seu desenvolvimento, incluindo a cooperação das esferas comercial, económica, científica e técnica” foram igualmente assinalados na conversa, adiantava a agência de propaganda do regime russo.
Antes, a 3 de Março, Sergei Lavrov acusou os líderes ocidentais de terem planos para uma “verdadeira guerra” contra a Rússia, que só poderá ser nuclear. Eritreia, Bielorrússia e Coreia do Norte subscrevem sem rodeios. Angola e Moçambique também subscreveram mas de forma não formal, como o MPLA explicou em “off” ao chefe Putin. Entretanto, apesar de general formado, condecorado e formatado pelos russos, João Lourenço mandou (até ver…) o seu querido líder (Putin) dar uma voltinha ao bilhar grande.
“Se algumas pessoas estão a planear uma verdadeira guerra contra nós, e eu penso que estão, deveriam pensar cuidadosamente”, disse Lavrov. “Não deixaremos que ninguém nos desestabilize”, assegurou. Bem que poderia parafrasear Agostinho Neto e dizer que “não vamos perder tempo com julgamentos”.
Se calhar, porque a UNITA tinha, na altura, sobre este assunto uma posição diametralmente oposta à do MPLA, admitia-se que os sipaios do MPLA iriam utilizar na campanha eleitoral a tese de que UNITA era um partido neonazi. Não o fizeram com todas as letras, mas andaram lá perto. Mas, afinal, a UNITA também tinha razão nesta matéria da Rússia/Ucrânia.
Na altura, o embaixador norte-americano em Luanda, Tulinabo Salama Mushingi, afirmou que a posição assumida por Angola (MPLA) de não-condenação da invasão russa da Ucrânia não afectaria a relação com os Estados Unidos, garantindo que os dois países iriam “continuar a trabalhar juntos”.
Angola, disse Tulinabo Salama Mushingi, é uma das quatro parcerias estratégicas dos EUA em África e irá prosseguir dessa forma. “Para nós, um voto sobre este assunto não afecta a nossa relação, vamos continuar a trabalhar juntos”, afirmou.
Depois, Angola absteve-se na votação da Assembleia Geral da ONU que condenou a invasão da Ucrânia pela Federação Russa com 145 países a favor e cinco contra. No total, 35 países abstiveram-se, incluindo 17 africanos. Ao abster-se de condenar o agressor, ao contrário da UNITA, o MPLA assumiu a condenação do agredido. Só seria preocupante se Angola não fosse uma sólida democracia como é a Rússia, a Eritreia ou a Coreia do Norte…